Na era em que algoritmos moldam o fluxo de informação e a atenção se tornou um dos ativos mais disputados, o poder das conexões emocionais volta a ocupar o centro da comunicação. Essa foi a mensagem central da V Cumbre Latinoamericana de Relaciones Públicas y Comunicación Estratégica, realizada em 25 e 26 de setembro em San Pedro Sula, Honduras. O evento internacional reuniu profissionais de mais de 12 países e 500 participantes na Universidade San Pedro Sula (USAP), com um objetivo em comum: repensar o futuro das relações públicas e da comunicação em um ambiente digital desafiador e inspirador.
Relações Públicas: construindo legitimidade e confiança
O encontro deixou claro que as relações públicas (RP) já não podem ser vistas apenas como espaço de exposição. A lógica tradicional de pautas na imprensa, eventos e gestão de crises se mostra insuficiente diante da complexidade atual. Hoje, RP significa construir legitimidade e confiança em escala, interpretar dados de forma humanizada, ser guardião da credibilidade em um cenário de fake news e desenvolver narrativas capazes de dialogar com diferentes gerações em diferentes territórios – físicos e digitais.
Não basta estar em todas as plataformas se a mensagem não atravessa os filtros cognitivos e emocionais das pessoas. Também não basta acumular métricas de vaidade se não houver propósito real. O que gera impacto duradouro são vínculos autênticos, sustentados por ética, emoção e consistência.
Os três eixos da comunicação estratégica
Essa visão ampliada se materializou em três grandes eixos. O primeiro é a convergência tecnológica. O futuro das RP é inevitavelmente digital, mas não se trata de pulverizar esforços em múltiplos canais, e sim de integrar plataformas, inteligência artificial, automação e análise de dados em estratégias coerentes. Quando bem aplicada, a IA amplia a produtividade, personaliza mensagens e permite monitoramento em tempo real. Mas seu valor só se realiza quando equilibrada pela sensibilidade crítica e pelo julgamento humano.
O segundo eixo é a emoção. As mensagens só se consolidam quando deixam marcas que permanecem na memória, reorganizando-se ao longo do tempo e influenciando percepções futuras. A neurocomunicação – tema apresentado pelo argentino Antonio di Génova, presidente da Redirp (Red Iberoamericana de Relaciones Públicas), que organiza o evento – mostrou-se central nesse processo: cada interação é uma “huella mnémica”, ou uma “marca de memória” (em uma tradução livre), capaz de moldar escolhas e atitudes.
É por isso que a comunicação estratégica não pode se limitar ao imediato; precisa criar experiências que emocionem e que permaneçam. Uma campanha, uma história bem contada ou uma interação significativa pode criar uma huella mnémica no público, uma marca emocional e cognitiva que faz com que as pessoas se lembrem da mensagem e a conectem com sentimentos.
O terceiro eixo é a responsabilidade social e institucional. Hoje, empresas também exercem soft power e precisam compreender contextos culturais e geopolíticos para fortalecer sua legitimidade. O conceito de soft power, cunhado pelo cientista político Joseph Nye (Harvard) nos anos 1990, ajuda a entender o papel ampliado das organizações na sociedade contemporânea. Diferente do hard power, baseado na força ou nos recursos econômicos, o soft power se sustenta na capacidade de atrair, engajar e convencer por meio de reputação, valores e narrativas culturais.
O soft power e as Relações Públicas
Atualmente, não apenas governos, mas também empresas e instituições exercem esse poder simbólico, influenciando comportamentos e agendas sociais. No contexto das Relações Públicas latino-americanas, trabalhar o soft power significa consolidar legitimidade, criar vínculos de confiança e posicionar organizações como atores capazes de impactar positivamente a vida coletiva. Diplomacia empresarial, sustentabilidade e propósito tornaram-se exigências inegociáveis. Marcas e instituições são cobradas por ações concretas, e cabe às RP articular narrativas de impacto que expressem diversidade, responsabilidade corporativa e compromisso com a sustentabilidade.
Nesse cenário, a América Latina aparece como protagonista natural. Nossa diversidade cultural, somada à resiliência e à criatividade, nos permite traduzir dados em histórias vivas, tecnologia em proximidade e estratégia em emoção. A integração regional, destacada em várias falas, não é apenas desejável: é o caminho para consolidar uma identidade comunicacional própria e projetá-la ao mundo.
Liderança multigeração e o futuro das Relações Públicas
Minha participação no evento, falando sobre liderança multigeracional, reforçou esse panorama. As transformações demográficas mostram que hoje convivem cinco gerações nos mesmos espaços de trabalho, cada uma com seus valores, linguagens e expectativas. O desafio não é eliminar diferenças, mas transformá-las em potência coletiva. Escuta ativa multicanal, mentorias cruzadas e narrativas inclusivas são algumas das formas de orquestrar essa diversidade em torno de um propósito comum. O futuro da liderança, nesse contexto, está em saber combinar sabedoria e inovação, tradição e disrupção, experiência e energia criativa.
Representar o Brasil nesse encontro foi uma honra. Não apenas pelo reconhecimento individual, mas porque mostrou que nosso país é respeitado no campo da comunicação estratégica latino-americana. Temos profissionais preparados, criativos e capazes de contribuir de forma consistente para essa integração regional que, mais do que uma escolha, é uma necessidade. Ainda assim, há espaço para um diálogo mais próximo entre o Brasil e nossos irmãos latinos. O futuro exige uma convergência em estratégias cada vez mais integradas.
Como foi repetido em Honduras: o futuro das RP será definido por quem souber transformar tecnologia em vínculo, diversidade em potência e emoção em impacto real.
— Regina Valente, jornalista e head de PR na Agência Pub.
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