O avanço dos agentes autônomos de inteligência artificial transformou a forma como empresas operam na nuvem. Além disso, ampliou a superfície de ataque digital. No Brasil, onde 83% das organizações planejam manter ou ampliar investimentos em IA no próximo ano, cresce a preocupação com o fato de que esses sistemas, capazes de tomar decisões de forma independente, também podem contornar barreiras tradicionais de segurança e abrir caminho para novos tipos de incidentes.
Ameaças impulsionadas por IA: um novo cenário de risco
Relatórios recentes mostram que agentes de IA capazes de agir por conta própria estão sendo empregados tanto por empresas quanto por cibercriminosos. Isso cria uma urgência imediata para repensar a proteção em cloud. Em uma simulação da Unit 42 (Palo Alto Networks), por exemplo, um ataque de ransomware conduzido inteiramente por IA percorreu todas as etapas – da invasão à exfiltração de dados – em apenas 25 minutos, cem vezes mais rápido que o normal. Esse “salto” de velocidade e autonomia gera um alerta: métodos mais tradicionais de segurança já não dão conta dessa realidade.
Um dos principais desafios dos ataques orquestrados com IA é que esses agentes operam de forma totalmente adaptativa e imprevisível. Diferentemente de programas estáticos, eles podem tomar decisões, aprender com erros e ajustar estratégias em tempo real.
Agentes autônomos e a escalada de privilégios
Na prática, um único agente consegue encadear múltiplas ações sem intervenção humana, interagindo com diversos serviços na nuvem em sequência. Se esse agente tiver credenciais privilegiadas, cada ação adicional pode ampliar drasticamente o raio de impacto de um eventual ataque. O problema é que, muitas vezes, empresas concedem a esses bots chaves de API, tokens OAuth ou contas de serviço com permissões elevadas para que eles funcionem – acessos que muitas vezes os times de segurança nem conseguem enxergar completamente.
Com tanta liberdade, um agente automatizado dentro da nuvem pode contornar barreiras que antes o protegiam, como firewalls ou segmentações de rede. Afinal, no ambiente moderno de nuvem e trabalho remoto, o modelo tradicional de perímetro fixo protegido por firewalls tornou-se ineficaz.
Ou seja, confiar apenas em bloqueios de porta e redes separadas já não basta, pois esses agentes conseguem atuar “por dentro”, movendo-se com identidades válidas e burlando controles rígidos. Isso representa um cenário de risco completamente novo: ameaças mais rápidas, inteligentes e persistentes do que nunca.
Estratégias de mitigação para a segurança na nuvem
Empresas e especialistas vêm adotando estratégias modernas de proteção para equilibrar os benefícios da IA com a segurança necessária. Uma dessas abordagens é a arquitetura Zero Trust, que parte do princípio de que nenhum acesso na rede é confiável por padrão, exigindo verificação contínua de identidade e contexto.
Na prática, isso significa que mesmo um agente de IA interno deve passar por autenticações e autorizações constantes a cada ação – nada de trânsito livre só porque já “está lá dentro”. Políticas de segurança baseadas em identidade e comportamento complementam essa estratégia: sistemas de gestão de identidades agora avaliam em tempo real quem (humano ou máquina) está tentando acessar o quê, de onde e em quais condições, liberando ou bloqueando acessos conforme o nível de risco detectado.
Por exemplo, uma autenticação multifator adaptativa (MFA adaptativa) pode exigir fatores extras apenas se o login do agente ou usuário fugir do padrão (um horário incomum, um IP diferente etc.), tornando a segurança menos intrusiva e mais inteligente. Da mesma forma, políticas de menor privilégio dinâmico são cada vez mais aplicadas: um agente de IA recebe apenas permissões mínimas necessárias e, só ganha acessos adicionais de forma controlada quando realmente provar que precisa deles.
Em paralelo, soluções de segurança cloud-native evoluíram para lidar com essa complexidade. Cloud-Native Application Protection Platforms (CNAPPs) surgiram como plataformas unificadas que integram diversas funções de proteção em nuvem num só pacote, cobrindo desde a análise de configurações e vulnerabilidades até a defesa em tempo de execução das cargas de trabalho.
Essa visão unificada melhora a visibilidade e automatiza o monitoramento contínuo dos ambientes multicloud, facilitando a detecção de anomalias que um agente malicioso poderia causar. Outras medidas incluem o uso de IA pela própria segurança: hoje já existem sistemas de User and Entity Behavior Analytics (UEBA) alimentados por inteligência artificial capazes de identificar padrões anômalos de uso e adaptar políticas defensivas em tempo real.
A segurança em nuvem deve evoluir de modo proativo e ágil, antecipando as movimentações desses novos agentes, em vez de apenas reagir após um desastre. A era dos agentes de IA já começou – e com ela, uma nova geração de ameaças. Cabe agora às organizações responderem à altura, fortalecendo suas defesas antes que esses desafios se tornem problemas irreversíveis. Neste cenário, em que algoritmos tomam decisões em fração de segundo, a capacidade de adaptação e resposta rápida dos defensores fará toda a diferença para garantir que a nuvem continue sendo um ambiente confiável para inovação.
— Felipe Guimarães, CISO da Solo Iron