Brasil e Estados Unidos adotam posturas opostas em relação às migrações, um debate que ganha destaque no cenário internacional. De um lado, o Brasil expande sua política humanitária, enquanto os Estados Unidos intensificam barreiras e deportações. Essa divergência expõe modelos distintos de poder, economia e mobilidade global.
Enquanto o Brasil amplia políticas de acolhimento humanitário, os Estados Unidos reforçam barreiras para a entrada e permanência de imigrantes. Essa diferença de abordagem ganhou força nas últimas semanas, com o endurecimento das medidas migratórias anunciadas pelo governo de Donald Trump e o discurso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em defesa da solidariedade internacional e do respeito aos direitos humanos.
Brasil amplia refúgio e EUA intensifica deportações
Dados do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare) revelam que o Brasil reconheceu mais de 77 mil pedidos de refúgio em 2024, um aumento de 60% em relação a 2022. A maior parte das solicitações partiu de cidadãos da Venezuela, Haiti e Afeganistão. Além disso, o governo informou que cerca de 35 mil brasileiros foram repatriados nos últimos dois anos, em um esforço de reintegração de quem vive em situação irregular no exterior.
Nos Estados Unidos, a política adotada é inversa. Relatórios do Departamento de Segurança Interna (DHS) e da agência Reuters mostram que, apenas nos primeiros nove meses de 2025, mais de 180 mil pessoas foram deportadas, o maior número desde 2019. O governo americano também ampliou as barreiras físicas e tecnológicas na fronteira com o México, retomando medidas suspensas em administrações anteriores.
Inclusão versus Exclusão: Impactos nas Nações
Para o advogado Daniel Toledo, especialista em Direito Internacional e fundador da Toledo e Advogados Associados, as duas posturas refletem visões opostas sobre o papel da imigração na construção de um país.
O Brasil aposta na inclusão e no acolhimento, enquanto os Estados Unidos seguem reforçando a lógica do controle e da exclusão. Ambas as estratégias têm impactos profundos sobre o capital humano, a inovação e a imagem internacional das nações — Daniel Toledo, advogado.
Toledo explica que políticas migratórias mais abertas tendem a impulsionar setores estratégicos, como tecnologia e empreendedorismo. Segundo estudo da National Foundation for American Policy, 45% das empresas de tecnologia listadas na Fortune 500 foram fundadas por imigrantes ou filhos de imigrantes. A história econômica americana mostra que o país cresceu com base na diversidade. Ao restringir a entrada de talentos, o governo de Trump pode comprometer a própria competitividade global”, afirma o advogado.
Desafios brasileiros na integração de imigrantes
Em contrapartida, o especialista ressalta que o Brasil ainda enfrenta desafios para transformar sua política humanitária em ganhos efetivos de desenvolvimento. “O país acolhe, mas ainda integra pouco. É preciso criar políticas que liguem o acolhimento à capacitação e à geração de renda. A solidariedade é fundamental, mas precisa ser acompanhada de planejamento”, defende.
Além disso, as medidas adotadas pelo governo Trump também afetam diretamente brasileiros que vivem nos Estados Unidos. De acordo com o Migration Policy Institute, há cerca de 500 mil brasileiros com status legal no país e outros 180 mil em situação irregular. Com o aumento das deportações, cresce o temor entre quem aguarda a regularização.
Tenho recebido inúmeros relatos de brasileiros que pensam em retornar ao Brasil ou transferir seus investimentos. O clima de insegurança jurídica voltou a preocupar as famílias — Daniel Toledo, advogado.
Impacto nas regras migratórias e vistos
O endurecimento das regras migratórias já afeta categorias de vistos de trabalho e investimento. Dados do Departamento de Estado dos EUA apontam uma redução de 12% na emissão de vistos H-1B, voltados a profissionais qualificados, e atrasos de até 40% na análise de vistos EB-2 e EB-5, voltados a investidores e profissionais de interesse nacional. “Essas mudanças encarecem e dificultam o processo de imigração legal, criando um ambiente mais hostil mesmo para quem cumpre todas as exigências”, explica o especialista.
Enquanto isso, o governo brasileiro segue reforçando sua imagem no campo humanitário. Em setembro, Lula defendeu na Assembleia Geral da ONU a necessidade de “responsabilidade compartilhada” entre as nações no acolhimento de refugiados e criticou políticas migratórias que “criminalizam a pobreza”. A postura do Brasil tem sido elogiada por entidades como o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur) e a Organização Internacional para as Migrações (OIM).
Para Daniel Toledo, o contraste entre os dois modelos representa um retrato simbólico do cenário global. “De um lado, vemos governos que entendem a migração como parte natural da economia moderna; de outro, líderes que a tratam como ameaça. O resultado é uma disputa entre o medo e a esperança, entre muros e pontes. E quem vive no meio disso são pessoas reais, com sonhos e histórias que não cabem em políticas simplistas”, reflete.
O especialista defende que o futuro das migrações dependerá da capacidade dos países de equilibrar soberania e humanidade. “Nenhuma nação prospera isolada. O mundo precisa de regras, mas também de empatia. O desafio é construir políticas que enxerguem a imigração não como problema, mas como oportunidade”, conclui.






