A violência contra a mulher também veste crachá. Um recente acordo entre o Ministério do Trabalho e Emprego e o Ministério das Mulheres prioriza vagas de emprego e qualificação para mulheres vítimas de violência, reacendendo o debate sobre políticas públicas e a transformação de vidas em risco. Essa iniciativa surge em um momento crítico, com o Brasil registrando um aumento nos casos de feminicídio e revelando a dependência financeira como um dos principais obstáculos para que mulheres rompam ciclos de agressão.
Desafios na Implementação do Acordo
Embora o acordo represente um avanço, Renata Seldin, doutora em Gestão da Inovação, aponta desafios na implementação, desde a falta de articulação entre serviços de atendimento até a dificuldade de inserção no mercado formal. Ela acompanha de perto o impacto da desigualdade estrutural na trajetória profissional das mulheres.
Com uma semana de atraso do Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra as Mulheres (25/11), observamos uma sucessão de casos graves de feminicídio e novas pesquisas sobre o aumento da violência doméstica. No entanto, também nos deparamos com notícias que apontam para uma mudança nesse cenário: o governo criou uma pensão especial para filhos de vítimas de feminicídio, paga pelo INSS, garantindo um salário mínimo mensal até os 18 anos, mediante requisitos de renda e comprovação do crime. O benefício, previsto para iniciar em dezembro de 2025, foi regulamentado pelo Decreto nº 12.636/2025.
Além disso, o Congresso também tem promovido alterações na Lei Maria da Penha, como a Lei nº 15.125/2025, que permite a monitoração eletrônica do agressor durante medidas protetivas. Adicionalmente, 6 de dezembro marcou o Dia Nacional de Mobilização dos Homens pelo Fim da Violência Contra as Mulheres (Lei 11.489/2007), reforçando a corresponsabilidade masculina.
A Violência no Ambiente de Trabalho
Apesar de todos esses avanços, ainda se discute pouco sobre a violência contra a mulher no ambiente de trabalho. Basta considerar o que se espera de um colaborador “normal”: ser pontual, entregar mais do que o esperado, vestir a camisa. Mas e de uma colaboradora? Acrescente: vestir-se de forma “adequada”, “ser forte”, encarar tudo “como um homem”, não se ausentar em crises menstruais e fazer vista grossa para comentários e comportamentos inadequados.
Em muitos ambientes, espera-se que mulheres deixem parte de quem são na porta e entrem descomplicadas, neutras e produtivas. É desse padrão de exigência e silêncio que nasce boa parte da violência que enfrentam no trabalho.
Microagressões e Seus Impactos
Essa violência não é apenas o assédio. Às vezes, é a reunião em que se tenta falar e não consegue, o chefe que sabe como desestabilizar, o olhar que diminui, a promoção que não vem, o salário menor que o do colega homem.
Para quem já precisou sobreviver a outros medos, cada microagressão desperta gatilhos que não desligam facilmente. E é aqui que a violência encontra o burnout. Pesquisas recentes mostram que trabalhadores expostos à violência psicológica têm risco significativamente maior de desenvolver burnout. Não é difícil entender o porquê: quando o corpo aprende a sobreviver, não relaxa mais; a mente se acostuma a mapear perigos; o ambiente reforça a sensação de desproteção; a exaustão deixa de ser fase e vira modo de existência.
Responsabilidade Corporativa e Ambientes Seguros
Em uma semana em que se fala tanto das agressões explícitas, é preciso lembrar que muitas mulheres adoecem silenciosamente em empresas que não reconhecem a violência que se infiltra nas entrelinhas, nos aspectos moral, emocional e institucional. O ambiente de trabalho segue sendo um dos espaços onde a violência contra mulheres se reproduz com mais sutileza e menos responsabilização. Reconhecer isso não é fragilidade, mas sim responsabilidade corporativa.
Ao lembrar que violência também se mede em interrupções, silenciamentos e pequenas erosões diárias da nossa voz, podemos construir ambientes seguros, lutando por dignidade, autonomia e futuro.
No 25/11, no 06/12 e em todos os outros dias do ano, falar sobre isso é permitir que mulheres existam inteiras, sem esconder traumas ou viver no silêncio. Que o trabalho deixe de ser território de sobrevivência e possa, finalmente, ser um espaço de vida.
Renata Seldin é doutora em Gestão da Inovação, com mais de 24 anos de experiência como executiva em consultoria de gestão. Também autora de “As perdas no caminho”, ministra palestra sobre carreira e compartilha informações sobre o assunto nas redes sociais (Instagram: @renata_seldin).






