Em preparação para a COP30, a maior conferência climática do mundo, o Centro Universitário de Brasília (CEUB) promoveu o simpósio “Uso da Terra, Governança Climática e o Caminho para a COP30”. O evento, realizado nesta terça-feira (4), reuniu pesquisadores e juristas de diversos países para discutir soluções jurídicas e científicas para a crise climática global. A governança climática foi tema central do encontro.
O papel do Direito Ambiental
Coordenado pelos professores de Direito do CEUB, Márcia Leuzinger e Nitish Monebhurrun, o simpósio destacou o papel crucial do Direito Ambiental como ferramenta de justiça, reconstrução e garantia de um futuro para as próximas gerações.
Entre os convidados internacionais, estiveram presentes Michael Rodi e Till Reinholz, do Instituto de Proteção Climática, Energia e Mobilidade (IKEM) da Alemanha; Oliver Ruppel, professor da Universidade de Stellenbosch (África do Sul) e da Universidade de Graz (Áustria); Ievgeniia Kopytsia, pesquisadora ucraniana do IKEM; e os australianos Andrew Lawson e Paul Martin, da University of New England (UNE). Mariana Cirne, professora do CEUB, completou o painel com uma análise sobre justiça climática e litigância ambiental no contexto nacional.
A importância do solo na agenda climática
Ao iniciar as apresentações, Till Reinholz ressaltou que a Europa está começando a reconhecer a importância do solo na agenda climática. Ele observou que, apesar dos avanços do continente nas transições energética e de transporte, a centralidade do solo como “base da vida” ainda é negligenciada. “Os solos armazenam tanto CO₂ quanto a atmosfera e os oceanos juntos”, afirmou o pesquisador, defendendo a criação de um marco jurídico que coloque o solo no centro das políticas ambientais europeias. Para Reinholz, o desafio é regulamentar um bem público que permanece, em grande parte, sob domínio privado.
Oliver Ruppel, especialista em Direito Constitucional e Ambiental, reforçou a ligação entre justiça intergeracional e proteção do solo. Ele notou que, apesar das convenções globais sobre água, atmosfera e oceanos, ainda não existe um instrumento jurídico específico para o solo. Ruppel defendeu que o tema seja elevado à categoria de segurança internacional e revelou estar elaborando uma lei modelo continental junto à União Africana. “Se queremos proteger a atmosfera, precisamos do solo como sumidouro de carbono. Ele é o segundo maior do planeta, depois dos oceanos”, explicou.
Guerra, degradação ambiental e a urgência da ação
Ievgeniia Kopytsia apresentou uma análise comparativa com o Brasil, destacando desafios comuns, como a degradação do solo, incêndios florestais e contaminação de rios, mesmo em contextos diferentes. Ao lembrar que 10% das terras agrícolas ucranianas foram contaminadas por explosivos desde o início da guerra, ela classificou a natureza como “a vítima silenciosa dos conflitos”. Segundo Kopytsia, o Direito Ambiental deve ser visto como um instrumento de reconstrução e sobrevivência.
A crise é o momento em que o forte mais importa e o forte é a ação, a liderança e a transformação.
— Ievgeniia Kopytsia, pesquisadora do IKEM
Representando a Austrália, Andrew Lawson comentou sobre a fragmentação da governança ambiental em seu país, caracterizada pela ausência de um tribunal federal específico e pela falta de uniformidade nas políticas estaduais. “Temos boas práticas agrícolas, mas uma regulação inconsistente e muitas resistências políticas”, afirmou. Lawson defendeu o fortalecimento da gestão hídrica e a ampliação do protagonismo dos povos indígenas na formulação das políticas ambientais, além de propor sete áreas de colaboração entre Brasil e Austrália, incluindo governança, mercados de carbono e valorização de saberes tradicionais.
Litigância climática no Brasil
Encerrando o simpósio, a professora Mariana Cirne apresentou a perspectiva brasileira sobre litigância climática e justiça intergeracional. A ex-procuradora nacional de Defesa do Clima e do Meio Ambiente destacou avanços obtidos por meio do Judiciário, como a reativação do Fundo Amazônia e o reforço da fiscalização ambiental.
O Brasil é o segundo país em número de ações judiciais climáticas. A litigância tem sido uma ferramenta concreta para transformar decisões políticas em resultados reais.
— Mariana Cirne, professora do CEUB
Para a professora do CEUB, a sustentabilidade passa por “colocar o clima na vida das pessoas”, citando ações locais, como obras de contenção em Recife, que representam políticas efetivas de adaptação. Por fim, a coordenadora do evento, Márcia Leuzinger, reforçou a importância da integração entre ciência, direito e sociedade: “Discutir o clima é discutir a vida. E o CEUB tem o papel de colocar o conhecimento a serviço dessa mudança”.






