Um estudo comparativo sobre a evolução dos sistemas de compliance no Brasil e nos Estados Unidos revela diferenças estruturais, bases jurídicas e setores impactados, além de pontos de convergência regulatória. O material analisa transformações históricas, legislações e desafios atuais, especialmente com novas tecnologias e o cenário internacional.
Origens nos EUA e no Brasil
O sistema de compliance nos Estados Unidos surgiu no início do século XX, em resposta a crises regulatórias e escândalos corporativos. A criação do Food and Drug Administration em 1906 marcou o primeiro esforço governamental americano para estabelecer controles obrigatórios sobre atividades econômicas.
No Brasil, a incorporação formal de mecanismos de compliance ocorreu depois, com a Lei 9.613 de 1998, que abordou crimes de lavagem de dinheiro e ocultação de bens, estabelecendo o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF).
Marcos Regulatórios e a OCDE
A OCDE consolidou o compliance como programa de integridade corporativa transnacional, estabelecendo diretrizes de conformidade normativa que transcendem fronteiras nacionais e enfatizam o combate à corrupção em escala global.
Ambos os países adotaram essas diretrizes, porém em contextos institucionais distintos. Enquanto os Estados Unidos desenvolveram um sistema maduro e descentralizado, com agências reguladoras especializadas exercendo controle setorial, o Brasil construiu um framework mais centralizado, fundamentado em legislações específicas que abordam particularidades da administração pública e do setor privado.
Diferenças Jurídicas Fundamentais
O Brasil estrutura seu sistema de compliance sobre fundamentos de civil-law, com legislação codificada que determina o comportamento corporativo. Já os Estados Unidos operam sob regime de common-law, onde precedentes judiciais têm papel central na interpretação das normas.
No Brasil, o compliance vincula-se diretamente a normas como a Lei Anticorrupção (12.846/2013), que estabelece parâmetros de conduta para pessoas jurídicas. Nos Estados Unidos, há maior flexibilidade interpretativa pelos tribunais, permitindo que agências adaptem exigências conforme a jurisprudência.
Arquitetura Institucional e Responsabilidade Corporativa
Nos Estados Unidos, o Federal Reserve System e agências como a SEC exercem autoridade descentralizada sobre setores específicos. No Brasil, a estrutura é mais centralizada, com o COAF e a Advocacia-Geral da União coordenando a aplicação das normas.
A modalidade de responsabilidade corporativa também diverge. Nos Estados Unidos, o compliance visa a responsabilidade penal das pessoas jurídicas, aplicando estruturas de negociação. No Brasil, a Lei Anticorrupção estabelece um modelo integrado que acumula responsabilidade administrativa, civil e penal.
Aplicação em Setores Específicos
No setor financeiro, o Brasil implementa regulações rigorosas através da Lei 12.846/2013 e resoluções do Banco Central. Nos Estados Unidos, o Dodd-Frank Act de 2010 estabelece um framework descentralizado que atribui autoridade a múltiplas agências.
No contexto de proteção de dados, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) brasileira e o Health Insurance Portability and Accountability Act (HIPAA) americano ocupam papéis análogos, embora com enfoques distintos.
Setor Público e Similaridades Essenciais
No setor público, o Brasil exige conformidade por meio da Lei das Estatais (Lei 13.303/2016). Nos Estados Unidos, entidades federais e estatais implementam conformidade mediante diretrizes da Office of Management and Budget.
Apesar das diferenças, Brasil e Estados Unidos convergem em princípios fundamentais de compliance. Ambos enfatizam a prevenção da corrupção e da lavagem de dinheiro, reconhecendo que esses fenômenos prejudicam a integridade institucional.
Os sistemas convergem igualmente na exigência de programas de conformidade estruturados e abrangentes nas organizações públicas e privadas. Ambos reconhecem que o compliance transcende a mera conformidade passiva com normas.
Uma similaridade crucial reside na adoção, por ambas as jurisdições, das diretrizes da OCDE e de instrumentos internacionais como a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção. Essa harmonização demonstra convergência em princípios fundamentais como transparência, accountability e responsabilidade corporativa.
Desafios e Perspectivas de Convergência Regulatória
Ambos os países enfrentam desafios na implementação prática do compliance, particularmente quanto à conformidade em organizações menores e na garantia de que programas não se tornem meramente formais.
A globalização das operações comerciais cria pressão por harmonização regulatória entre Brasil e Estados Unidos, principalmente em setores com presença multinacional intensiva como aviação, finanças e tecnologia.
Além disso, ambos os ordenamentos reconhecem a necessidade de atualização contínua das normas frente a riscos emergentes, especialmente os associados à inteligência artificial, comércio digital e operações em criptomoedas.






