O anúncio do Banco Central sobre o encerramento das etapas de desenvolvimento do Drex, a moeda digital brasileira, levanta debates sobre o futuro da tokenização no Brasil. A decisão encerra um ciclo de quase quatro anos de testes e reposiciona o país em um momento de forte expansão mundial das CBDCs (moedas digitais de bancos centrais).
Segundo o BIS (Bank for International Settlements), 93% dos bancos centrais do mundo pesquisam, testam ou já operam versões digitais de suas moedas, e ao menos 11 países, entre eles China, Nigéria, Bahamas e Jamaica, já implementaram soluções em produção. O Brasil agora reduz o ritmo justamente no momento em que a tokenização de ativos e a digitalização de infraestruturas financeiras começam a ganhar tração global.
O que era o Drex?
Lançado em 2021 como Real Digital, o Drex buscava criar uma infraestrutura de liquidação baseada em registros distribuídos, permitindo a tokenização de títulos públicos, contratos, financiamentos e ativos privados. Os testes previam validar pagamentos contra entrega (DvP), liquidações financeiras instantâneas e interoperabilidade entre agentes. O fim da iniciativa, segundo analistas do mercado, interrompe a chance de o país liderar a transição para o crédito tokenizado em larga escala.
A avaliação é de Luis Molla Veloso, especialista em Embedded Finance e integração de serviços financeiros a plataformas digitais. Ele afirma que a interrupção traz impactos diretos na previsibilidade regulatória e no ritmo de inovação do setor.
O Drex representava um ambiente seguro para testar tokenização de ativos com supervisão do Banco Central. Sem um sandbox regulatório estruturado nesse nível, empresas e bancos tendem a desacelerar iniciativas que envolvem infraestrutura distribuída e liquidação programável.
— Luis Molla Veloso, especialista em Embedded Finance
Impacto da decisão
Dados recentes mostram por que o tema preocupa. Estimativas do FMI indicam que a tokenização pode movimentar globalmente mais de US$16 trilhões até 2030, impulsionada pela digitalização de títulos, contratos e meios de pagamento. No Brasil, as projeções da autarquia apontavam para uma adoção gradual, com uso inicial em operações de crédito imobiliário e financiamento de veículos. A interrupção do Drex coloca incerteza sobre essa agenda.
Veloso explica que o impacto maior recai sobre bancos, fintechs, agentes de infraestrutura e empresas que vinham adaptando sistemas internos ao modelo de liquidação programável proposto pelo Drex.
A agenda de tokenização não desaparece, mas perde velocidade. Instituições que estavam preparadas para testar contratos inteligentes com garantia de liquidação regulada agora precisarão buscar alternativas menos padronizadas.
— Luis Molla Veloso, especialista em Embedded Finance
O especialista também aponta efeitos sobre o ecossistema de inovação financeira. Com o avanço do Open Finance, cuja fase mais recente amplia o compartilhamento de dados de investimentos, seguros e câmbio, a tendência seria integrar essas informações a ambientes tokenizados, abrindo espaço para novos modelos de crédito e seguros automatizados.
Vantagens estruturais e próximos passos
Apesar do fim da plataforma experimental do Drex, Veloso avalia que o país ainda possui vantagens estruturais, como o histórico de inovação regulatória do Banco Central com o Pix e o Open Finance.
A questão é como transformar esse capital institucional em uma estratégia clara para a próxima geração de infraestrutura financeira. O mundo caminha para sistemas mais programáveis e interoperáveis; o Brasil não pode perder esse ciclo.
— Luis Molla Veloso, especialista em Embedded Finance
Enquanto o Drex é interrompido, países da OCDE aceleram suas próprias agendas. O BCE, por exemplo, avança para a fase de preparação do Euro Digital, com testes previstos para 2026. Nos Estados Unidos, pilotos privados com apoio do Federal Reserve exploram a liquidação em ambientes tokenizados. Para pesquisadores do BIS, a integração entre tokenização, pagamentos instantâneos e moedas digitais será a base do sistema financeiro das próximas décadas.
Para Veloso, o ponto-chave agora é garantir clareza sobre o futuro da agenda digital brasileira.
O encerramento do Drex não significa o fim da inovação, mas exige transparência sobre quais projetos seguirão. A ausência de um direcionamento claro pode afastar investimentos em infraestrutura financeira justamente quando o mundo acelera.
— Luis Molla Veloso, especialista em Embedded Finance
Com o avanço da tokenização global e o uso crescente de pagamentos instantâneos (o Pix já supera R$ 2 trilhões em transações mensais, segundo o Banco Central), o Brasil terá de redesenhar sua estratégia para não perder protagonismo na próxima onda de digitalização financeira.





