A violência doméstica no Brasil tem graves impactos, que vão além das agressões físicas. A saúde mental, o bem-estar físico e o sistema público de saúde são diretamente afetados. De acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde de 2019 do IBGE, 17,3% dos adultos relataram violência psicológica e 4,1% violência física nos 12 meses anteriores.
Quem são as vítimas?
Um estudo de 2025 da Revista de Saúde Pública (Scielo) revela que as mulheres entre 20 e 59 anos, com ensino fundamental incompleto, autodeclaradas pardas e residentes em áreas urbanas do Sudeste são as mais afetadas. A Pesquisa Nacional de Violência contra a Mulher (DataSenado, 2024) confirma esse perfil, agravado por fatores socioeconômicos, como falta de renda e pouco acesso a políticas públicas.
A advogada Victória Araújo Acosta, especialista em direito de família e violência doméstica, explica que a violência não se resume à agressão física. “A violência deixa marcas invisíveis que nem sempre chegam aos tribunais. Depressão, ansiedade, estresse e adoecimento físico são consequências diretas de um ciclo que mistura medo, dependência emocional e desigualdade econômica”, afirma.
Violência não escolhe classe social
Embora os dados apontem as condições socioeconômicas das mulheres mais atingidas, a especialista ressalta que a violência não escolhe classe social, raça ou outros fatores. “Todas, infelizmente, estão sujeitas à violência doméstica. E precisamos aprender a não minimizar os sinais”, aponta.
Um estudo do Conselho Federal de Psicologia mostra que mulheres vítimas de violência têm até três vezes mais chances de desenvolver transtornos de ansiedade e depressão. Além disso, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que uma em cada três mulheres no mundo já sofreu algum tipo de violência física ou sexual, sendo essa agressão uma das principais causas de incapacidade psicológica e de doenças crônicas femininas.
Saúde mental nos tribunais
Victória explica que, na rotina forense, muitas mulheres chegam aos processos de guarda, divórcio ou medidas protetivas com o emocional abalado. “Nos tribunais, ainda é comum que a saúde mental da vítima seja vista como um detalhe. Mas ela é parte essencial da prova e da busca por reparação. O sofrimento psíquico precisa ser reconhecido como evidência do impacto da violência, com as consequências cabíveis”, diz.
A advogada alerta que a falta de suporte institucional e jurídico agrava o quadro. “Quando a mulher busca o Judiciário como último refúgio e não é ouvida ou tem sua palavra minimizada, o ciclo da violência se agrava, e abre-se espaço para violência processual e vicária, o que não pode ser permitido pelos advogados.”
Como ajudar?
Além de buscar representação especializada, Victória ressalta que a rede de apoio, formada por familiares, amigos, colegas de trabalho e vizinhos, tem papel decisivo na identificação e prevenção. “Sinais de isolamento, mudanças bruscas de comportamento, faltas frequentes no trabalho e medo constante são alertas de que algo pode estar errado. O silêncio da vítima não significa consentimento, e sim medo”, afirma.
A advogada orienta que qualquer pessoa pode ajudar de forma segura, sem confrontar o agressor. “Ouvir sem julgar, oferecer apoio emocional e indicar os canais de ajuda já é um passo importante. Em casos urgentes, a denúncia pode ser feita mesmo sem o consentimento da vítima, especialmente quando há risco à integridade física.”
Canais de ajuda
- Disque 180: funciona 24 horas por dia e garante anonimato;
- Aplicativo Proteja Brasil;
- Delegacias da Mulher (DEAMs);
- Centros de Referência de Atendimento à Mulher (CRAMs): oferecem acolhimento jurídico e psicológico.
Victória defende que “combater a violência não é apenas punir o agressor, mas criar um ambiente onde a mulher possa se reconstruir com dignidade, com escuta acolhedora e sem julgamentos. Prevenir é cuidar da saúde mental, fortalecer a autonomia econômica e garantir que nenhuma mulher precise escolher entre sobreviver e falar”, conclui.
Combater a violência não é apenas punir o agressor, mas criar um ambiente onde a mulher possa se reconstruir com dignidade, com escuta acolhedora e sem julgamentos. Prevenir é cuidar da saúde mental, fortalecer a autonomia econômica e garantir que nenhuma mulher precise escolher entre sobreviver e falar. — Victória Araújo Acosta, advogada






