Um novo curta-metragem, intitulado “Arandu”, dirigido por Vitória Rocha, jovem cineasta de Itaquaquecetuba, está ganhando destaque por apresentar uma nova perspectiva sobre a periferia no cinema. A obra, que nasceu dentro do próprio território, transforma a memória e o espaço em linguagem cinematográfica.
Território como autoria e linguagem
O filme levanta discussões importantes sobre quem narra as histórias da cidade e como a estética periférica impulsiona novas formas de cinema no Brasil. “Arandu” afirma o cinema como espaço de autoria, invenção e pertencimento.
Mais do que um retrato de Itaquaquecetuba, na Grande São Paulo, “Arandu” é um gesto de afirmação e autoria no audiovisual brasileiro. Ao combinar elementos de ficção e documental, o curta-metragem propõe uma nova forma de narrar o cotidiano das margens da metrópole. Além disso, a obra aborda o território, a memória e as relações comunitárias como cenários e matéria-prima que se transforma em linguagem cinematográfica, colocando em debate a importância da representação construída a partir de quem vive o território.
A câmera como extensão da vivência
Nesse contexto, a câmera se torna uma extensão do corpo, da vivência e da trajetória da diretora. Nascida e criada em Itaquaquecetuba, Vitória é estudante da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e sua formação pessoal e acadêmica é diretamente influenciada pelo que significa crescer e existir na periferia. Ao trazer essas experiências pessoais e coletivas para o campo estético, “Arandu” se posiciona sobre quem tem o direito de contar histórias e como essas narrativas podem ser estruturadas.
Com uma linguagem híbrida, que transita entre o documental, o cinema sensorial e a ficção, o filme se insere em uma tradição do cinema brasileiro que tensiona as fronteiras entre realidade e invenção. A obra dialoga com referências como Retratos Fantasmas (2023), de Kleber Mendonça Filho, e Ilha das Flores (1989), de Jorge Furtado, ao mesmo tempo em que constrói uma voz própria, ancorada na perspectiva periférica e feminina de sua realizadora.
Eu não queria só mostrar a cidade como ela é. Queria mostrar como a gente sente ela. Os ruídos, as ausências, o tempo do afeto. Isso também é linguagem.
— Vitória Rocha, diretora de “Arandu”
Segundo a diretora, é necessário levar luz a um entendimento do cinema como um campo sensível, onde o tempo e o espaço são reproduzidos, interpretados e ressignificados.
Desconstruindo estereótipos
Basta 15 minutos para romper com a visão estereotipada da periferia enquanto cenário de violência ou carência e oferecer um ponto de vista construído por quem vivencia esse território todos os dias, ressalta.
Diferente de abordagens externas, que frequentemente instrumentalizam a periferia como pano de fundo para reforçar estigmas sociais, “Arandu” parte de dentro. É resultado de um processo criativo coletivo em que jovens do próprio território assumem funções técnicas e criativas no set. Aqui, a juventude não é objeto de análise ou estatística, mas agente central de invenção, pensamento crítico e expressão artística.
Sou mulher, periférica, cineasta. Essas identidades caminham juntas no meu corpo e também na forma como filmo. O cinema é onde elas podem se afirmar.
— Vitória Rocha, diretora de “Arandu”






